O governo publicou ontem uma medida provisória que permite capitalizar o BNDES e a Valec, estatal do setor ferroviário, com títulos públicos e reduz o volume de gastos que o Tesouro Nacional terá que fazer com a equalização de juros nos empréstimos do BNDES ao setor privado. Nos dois casos, a MP evita o impacto dessas operações sobre o superávit primário do governo federal.
"Não há preocupação com o primário com essa medida. Não é relevante esse impacto. A preocupação é com a gestão financeira do banco [BNDES]", explicou o secretário-executivo interino do Ministério da Fazenda, Dyogo de Oliveira, se referindo às mudanças nas regras de equalização.
O banco estatal receberá capitalização do Tesouro de R$ 15 bilhões. A emissão de títulos aumenta a dívida bruta do governo federal, mas não é captada nas estatísticas do primário, porque foi feita como um "instrumento híbrido de capital e dívida", um empréstimo sem prazo de vencimento.
O mesmo foi feito com a Valec, que também terá R$ 15 bilhões num fundo de liquidez para viabilizar o plano de concessões de ferrovias do governo. "Sem a capitalização, o banco se desenquadraria de Basiléia 3, que começa a valer em 2014", explicou o secretário.
A economia do primário com a redução nos gastos de equalização de taxas de juros será feita por meio da renegociação de contratos já assinados entre o Tesouro Nacional e o BNDES. Originalmente, essas operações, que se referem principalmente ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI), custavam ao banco estatal algo entre 3% e 4% ao ano acima da TJLP. Mas os empréstimos aos tomadores finais eram feitos com juros de 1,5% ao ano. A diferença deveria ser coberta pelo Tesouro Nacional.
O Tesouro só quitou R$ 781 milhões da dívida com o BNDES e criou uma regra em que adia o pagamento em até dois anos. A partir de agora, o valor a ser pago também cairá, já que as taxas de juros das operações originais serão reduzidas. O governo não informou quanto será renegociado e nem a nova taxa.
A capitalização de estatais com títulos públicos, trocas de ativos e operações financeiras sofisticadas foram usadas pelo governo no fim do ano passado para garantir o cumprimento da meta de superávit primário e criticadas como "contabilidade criativa".
O BNDES também está autorizado a descasar ativos e passivos em dólar. A regra atual estabelece que apenas quando o banco captar em moeda estrangeira, poderá emprestar nessa modalidade. A partir de agora, a fonte de empréstimos dolarizados poderá ser a TJLP. Caberá ao banco, por meio de sua gestão de risco, travar eventuais perdas com esse descasamento.
A MP 618 trata ainda de pelo menos mais duas mudanças na contabilidade pública. O Tesouro Nacional fica autorizado a oferecer garantias em operações de crédito interno de subsidiárias de estatais, o que era proibido até então. Essa possibilidade estava reservada, apenas, para as empresas diretamente controladas pelo governo.
A MP alterou, ainda, a formar de cálculo da receita líquida dos municípios, retirando os ganhos provenientes de "outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, das operações urbanas consorciadas e da transferência do direito de construir".
Segundo Oliveira, a mudança da regra de cálculo é um "ajuste técnico", pois estava se considerando uma receita financeira como uma receita corrente. "Houve um ajuste no manual de contabilidade e estamos colocando na lei para adequar a legislação", disse o secretário. No entanto, essa medida pode beneficiar diretamente a prefeitura de São Paulo, que está no limite de comprometimento de receita para pagamento de dívida e tem receitas relevantes desse tipo.
O BNDES está elevando fortemente seus desembolsos este ano e planeja emprestar em 2013 mais do que os R$ 156 bilhões do ano passado. A projeção é do superintendente da área de planejamento do banco, Cláudio Leal, após a divulgação, ontem, da alta de 59% das liberações de janeiro a abril em relação ao ano passado, que somaram R$ 54,4 bilhões. Os desembolsos foram puxados pela indústria, que recebeu R$ 20,2 bilhões, alta de 113% no mesmo período.
Fonte: Valor Econômico - 07/06/2013
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